Número segue diminuindo; reportagem acompanhou medição de grupo de pesquisadores da UFRGS.
Além da diminuição do nível da água após 29 dias, a vazão (volume d’água que escoa pelo canal ao longo do tempo) do Guaíba segue diminuindo nesta sexta-feira (31).
Na seção em frente à Usina do Gasômetro, até a Ilha da Pintada, a vazão está em 7,97 milhões de litros por segundo, conforme medição realizada por pesquisadores da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).
É a menor vazão registrada desde o pico da enchente.
A reportagem acompanhou o grupo de pesquisadores do Instituto de Geociências e do Instituto de Pesquisas Hidráulicas, ambos da UFRGS, em um trajeto de barco pelo Guaíba nesta manhã gelada e enevoada em Porto Alegre.
Os especialistas e técnicos mediram a vazão, a velocidade e os sedimentos no corpo hídrico. A embarcação foi guiada pelo piloto Márcio Silva, 47 anos, que, após ter tido a casa inundada na Ilha Mauá, atualmente mora no barco e tem conduzido a equipe da universidade.
A média normal de vazão do Guaíba varia entre 1 e 2 milhões de litros por segundo.
No pico da inundação, entre os dias 5 e 6 de maio, os técnicos chegaram a medir valores superiores a 30 milhões de litros por segundo.
— Mostra que o sistema está esvaziando. A boa notícia aqui do norte é essa, a vazão está diminuindo porque já tem menos água no sistema. E a outra boa notícia é que lá no sul, em Rio Grande, a vazão lá continua elevada. Os colegas da FURG (Universidade Federal de Rio Grande) estão medindo 20 milhões, aí o sistema todo começa a esvaziar — explica o professor.
A vazão vem diminuindo gradualmente e mais rápido do que o previsto, conforme o professor. Houve uma redução significativa de mais de um milhão de litros por segundo na última semana.
Se prosseguir no ritmo atual, sem chuva e sem represamento pelo vento, a estimativa é de que retorne à medição normal nos próximos 10 dias, com redução de cerca de mais um metro do nível.
A lentidão no esvaziamento está diretamente relacionada à questão de circulação, que é diferente (fluvial) em relação à Lagoa dos Patos (lagunar).
A Bacia Hidrográfica do Guaíba tem 84 mil quilômetros quadrados. Ela começa nas nascentes dos rios Jacuí, Taquari, Sinos, Gravataí e Caí, que convergem para a região do Guaíba, parte final desse sistema.
O professor Elírio Toldo Jr, do Centro de Estudos de Geologia Costeira e Oceânica (Ceco) e do Instituto de Geociências (Igeo) da UFRGS, ressalta a importância de ter dados numéricos medidos em campo.
Os dados são medidos na seção do Gasômetro por praticidade logística, pois o levantamento é realizado rapidamente, de modo a se obter valores representativos das vazões no curso final do sistema fluvial.
Como é feita a medição no Guaíba
Para medir a vazão e a velocidade (que é de 80 cm/s), utiliza-se um sensor ultrassom de última geração – uma espécie de prancha que é amarrada e colocada na água. O barco movimenta-se lentamente pelo Guaíba para captar os dados.
— É um equipamento que usamos no mar, mas vimos que não podíamos deixar de registrar (a enchente) — explica Toldo Jr.
O equipamento mede a distância percorrida e a profundidade do leito – os dois dados geram a medida da área. Também é medida a velocidade da água naquele momento.
— Com a área que está sendo medida multiplicada pela velocidade, a gente acha a vazão, e é isso que esse equipamento mede — explica Aron Funke, técnico em hidrologia que monitora os dados no computador a bordo.
Já para medir a quantidade de sedimentos, os pesquisadores utilizam duas técnicas: uma sonda multiparâmetros, que fornece instantaneamente valores de turbidez, pH e temperatura; e uma garrafa, que é cuidadosamente preenchida com uma amostra da água do Guaíba. Quanto maior a turbidez, maior a concentração de sedimentos – esta é analisada em laboratório, filtrando a amostra.
Nesta sexta-feira, a turbidez média medida foi de 6,77 mg/L. No pico da enchente, no dia 5 de maio, o valor foi de 22,0 mg/L. Os dados também são úteis para entender a quantidade de sedimentos que irão para o sul do Estado.
Os dados são fundamentais, frisa Nilza dos Reis Castro, professora do IPH. Eles são utilizados para calibrar os modelos e para fazer previsões – alguns modelos utilizam apenas a cota para prever o nível, enquanto outros utilizam a vazão. Um ex-professor da UFRGS, por exemplo, está rodando modelos com os dados fornecidos pela equipe. Os modelos vão sendo testados para melhorar as previsões.
— A gente usa esse dado a curto prazo, hoje mesmo o professor passa os dados para uma professora da FURG, que já utiliza lá para fazer a previsão dos níveis da Lagoa dos Patos. A médio prazo, esses dados vão ser usados na tese de doutorado de um pesquisador que está aqui. A longo prazo, certamente vai ser usado por mais de 100, 200 anos, que a gente nem imagina — afirma.
Com as mudanças climáticas, a hidrometria (medição de vazão e do nível), a medição de chuva e as estações meteorológicas são imprescindíveis e deveriam ser rotineiras para a gestão da bacia, conforme a professora. Investimento em recursos, equipamentos e pessoal são extremamente necessários – e “não apenas no momento da tragédia”, salienta.
gauchazh.clicrbs.com.br