Câmera de segurança gravou policial militar disparando contra a criança, que estava em moto com pai. Ela foi ferida, está internada num hospital e tomou pontos na face. Polícia Civil investiga caso como tentativa de homicídio e tenta identificar PM que atirou.
Dois policiais militares de São Paulo investigados por estarem na viatura de onde partiu o tiro de airsoft que atingiu o rosto de uma bebê de 1 ano foram afastados. O caso ocorreu na madrugada desta terça-feira (26) na Rua Sete Estrelas, no Itaim Paulista, Zona Leste da capital, e foi gravado por câmera de segurança (veja acima).
“Os dois PMs que estavam na viatura envolvida na ocorrência foram identificados e preventivamente afastados enquanto as apurações estão em curso”, informa trecho da nota da pasta da Segurança.
O g1 apurou que os PMs já foram ouvidos pela corporação. A Corregedoria da Polícia Militar apura as condutas deles. Depois, os dois prestariam depoimentos na Polícia Civil, que investiga o caso como tentativa de homicídio. Apesar disso, o 67º Distrito Policial (DP), Jardim Robru, quer saber qual dos agentes fez o disparo que feriu a menina já que não há confirmação oficial de quem atirou.
Até a última atualização desta reportagem a arma de pressão usada no crime não havia sido apreendida ou entregue para as autoridades. O equipamento seria particular pois não faz parte do armamento oficial usado pela Polícia Militar. Airsofts são armas que usam munição de plástico e são usadas por praticantes de tiros esportivos em estandes apropriados.
“A SSP ressalta que a Polícia Militar é uma instituição legalista, que não compactua com desvios de conduta e que promove treinamentos constantes para que todos os seus integrantes ajam dentro dos protocolos estabelecidos”, continua o comunicado da Secretaria da Segurança.
Vídeo mostra tentativa de homicídio
Além de querer ouvir os policiais, a Polícia Civil analisa juntamente com a Polícia Técnico-Científica o vídeo que mostra quando um dos agentes que dirigia a viatura da Polícia Militar coloca o braço para fora da janela e atira na direção de uma moto, que cruzou seu caminho no sentido contrário.
No veículo estavam a menina e o pai dela, que pilotava sem capacete e sem habilitação. Ele havia pego a motocicleta emprestada de um amigo. Pela lei de trânsito é proibido andar de moto sem capacete e sem ter habilitação, além de transportar irregularmente crianças com menos de 10 anos de idade em motocicletas.
Essa infração é considerada gravíssima. Quem a comete pode receber multa como punição. O dono da moto também pode ter a carteira suspensa e o veículo apreendido por tê-lo emprestado a pessoa não habilitada.
Mas, segundo a investigação, o agente da PM não deu nenhuma ordem de parada para o piloto parar. E sequer registrou a ocorrência ou a levou para uma delegacia. O PM preferiu sacar uma arma de airsoft e disparou.
A bebê foi atingida por um artefato de plástico no rosto. O pai dela só notou que a filha foi ferida quando chegou em casa e viu a menina chorando e sangrando. Ela foi socorrida pelos familiares para o Hospital Tide Setubal, em São Miguel Paulista.
A menina recebeu anestesia geral e passou por cirurgia de emergência para a retirada do projétil, que estava alojado no rosto dela. A vítima levou pontos na bochecha e continuava internada até a última atualização desta reportagem. Ela não corre risco de morte.
A bala foi encaminhada à Polícia Técnico-Científica para ser periciada. Foi a família da menina que procurou o 50º Distrito Policial (DP), Itaim Paulista, onde registrou um boletim de ocorrência para apurar o caso. A investigação será feita pelo 67º DP, Jardim Robru.
‘Torpeza da conduta’, diz delegado
“Não houve ordem de parada, não houve abordagem policial, nenhum tipo de registro, nenhum tipo de comunicação”, disse o delegado Gregory Goes Siqueira, titular do 50º DP. “Conduta que julgo não ser adequada. O certo seria dar ciência à autoridade de plantão para que fosse feito o registro e a consequência jurídica dos fatos adequados.”
De acordo com o delegado, o PM que atirou na criança será responsabilizado criminalmente por tentativa de assassinato.
“Adianto que a conduta se amolda ao tipo penal de tentativa de homicídio, no mínimo a título de dolo eventual [quando se assume o risco de matar]”, falou Gregory. “Entendo que o policial militar que tem um conhecimento técnico prévio deve presumir que um disparo de airsoft daquela distância, numa moto no sentido contrario, poderia causar um acidente, uma fatalidade com a criança vindo a óbito em virtude de uma conduta deliberada, consciente e voluntária”.
Para o 50º DP, o fato de o policial militar ter usado um equipamento que não pertence à corporação aumenta a gravidade do que ele fez.
“Não há justificativa para utilizar um instrumento que nem faz parte do acervo que faz parte da atividade policial: o airsoft. O que demonstra a torpeza da conduta“, falou o delegado. “Pelas imagens é possível verificar que o policial, que estava na condição de motorista da viatura, efetua um disparo, um instrumento, depois conseguiu se constatar uma arma de airsoft pelas imagens.”
Menina ficou ferida e chorou
A madrinha da menina falou à reportagem que o pediu ao pai da criança para levar a filha dele até a sua casa. Mas quando chegou lá, viram a criança sangrando no rosto e chorando.
“A gente olhou, já estava furado e um monte de sangue nela“, afirmou a mulher, que não quis se identificar. “A gente tá abalado. Se ele tivesse dado a ordem, mandado parar, eu mesmo tinha descido da minha casa, pegado a neném. Só que um erro não justifica o outro porque a neném não tem culpa nenhuma“.
“Tão falando que foi airsoft, mas se é um tiro de verdade… iam matar a menina“, disse a madrinha da criança.
Testemunhas que moram na região filmaram viaturas da PM que foram até o local após o crime. Segundo elas, policiais procuravam câmeras de segurança.
Segundo a Ouvidoria da Polícia, o policial militar que atirou no rosto da criança poderá ser expulso da corporação.